quarta-feira, 21 de maio de 2008

AS ÁGUAS DI ROMA

Alguém me disse que só pelas fontes já valeria a pena ir a Roma. E é verdade. Mas as águas de que eu falo neste título veramente são outras... Piove, piove, piove in Roma. É certo que mesmo assim é tudo lindo e cada praça a que você chega, cada ruela que você vê e, sim, cada fonte grandiosa, vale os pés encharcados e as barras das calças que pingam. Até por que, eu só vi mesmo praça e fonte.

Entrar no Vaticano, impossível. Im-pos-sível. Desisti. Entrar no Coliseu, entrar em qualquer lugar, impossível. A Disney é aqui também. Brinquedos lotados. Filas de, pelo menos, duas horas. Na chuva. A Sistina ficou pra próxima. A Pietá também, infelizmente, embora ela viva dentro de mim.
Adesso, va bene.

NONA ANAMARIA E O RECADO
A chuva trouxe um ar um pouco triste aos dias em Roma. Mas, hoje, um lembrete veio bater na minha testa. Entrei em muitas igrejas e parece que Deus mandou um recadinho. No meio da tarde sentei num café e estava lá, pensando em qualquer coisa não muito feliz, me perguntando outras coisas também não muito promissoras, e eis que uma senhora na mesa ao lado começa a falar comigo. Mas começa a falar mesmo, como se fosse minha melhor amiga há anos, e como se eu entendesse italiano perfeitamente. O fato é que eu comecei a ouvir, e a participar muito do monólogo, embora não entendesse quase nada. No começo. Porque de repente comecei a entender... uns 50%. E ri com ela, gargalhei, lamentei, quase chorei... tudo entendendo só metade. Mas quem via tinha certeza de que eu entendia absolutamente tudo e tinha opiniões incríveis sobre cada história. Mas responder, eu só conseguia "va bene", "que belo", "é tchérto" e, depois de um tempo, "que bela vita la de lei, un exemplo!" ha questa parole - exemplo - in italiano?, perguntei, pazza. Si, si, ela disse. E fez aquela cara de modéstia, e aquele gesto com a mão que italiano faz pra "va bene, cosa fatchamo!". Ai, que engraçado que foi...

Mas ela falou, e falou, e falou, e falou - quase sem respiro - e me contou a vida inteira. E eu ouvi. Contou do marido, de onde mora atrás da igreja São Pedro, que a casa vale milhøes mas não vai vender porque vai deixar pros filhos. E falou dos filhos, claro, que não querem mais que ela more sozinha. E falou dos netos, que a amam - "la nona la nona la nona!" Me contou que conheceu o marido em 47, casou em 53, ele morreu não entendi em que ano. Chamava-se Maurizio, por causa do Mussolini, mas também não entendi por quê. Me mostrou foto antiga dos dois, 50 anos atrás, na mesma praça onde estávamos (claro que tirei uma foto dela com a foto!). Contou que eles tiveram, ou ainda tem, não sei, uma cantina, ou um frigorífico, ou alguma coisa onde se faz ou vende comida. Disse que faz pão em casa. E também sabão. Bem, pode ser que eu tenha entendido mal porque é estranho ela dizer que faz pão e sabão... ahahahaha

Em dado momento ela perguntou se eu era italiana - acho que porque eu só dizia "va bene" e "belo". Eu disse que era brasileira. Ela perguntou se eu "capisci tutto" que ela dizia. Bastou eu dizer SI SI que ela voltou a falar sem parar. Disse que vai fazer 80 anos, mas que está cheia de vida. Que sempre trabalhou muito, e que agora o importante é continuar contente. Então que ela está assim, sempre contente. Chova ou faça sol. Dia bom, dia ruim, dia mais ou menos, ela pensa na vida e fica contente. E disse que eu, assim, bela ragazza, certamente era sempre contente, por isso ela estava feliz em conversar comigo. (Acho que mesmo se soubesse que eu só estava entendendo metade). As últimas histórias que ela contou não entendi nada, mas morri de rir com ela, que estava adorando lembrar daquelas coisas... e o mais engraçado era que quando ela não lembrava a palavra que queria dizer, me perguntava... "que cosa chiama... cosa cosa cosa..." Aí que eu ria mesmo. Mas foi ótimo, afinal me lembrei que o importante é estar contente.

E o resto do meu dia foi bem mais alegre. Mesmo na chuva.
E ao pé do rio Tevere e só ao pé dele.

"Piove... piove...
fa tempo che piove qua, gigi
E io, sempre io,
sotto la tua finestra..."

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