sábado, 5 de janeiro de 2008

O VILAREJO SECRETO


Lavras Novas.

Esse é o nome do lugar que a gente "descobriu" antes de chegar a Ouro Preto. Tá, não tem nada de secreto, na verdade. Mas pra gente foi. A idéia de passar nessa cidade era só pra experimentar uma comidinha em um restaurante indicado no Guia: Crepe nas montanhas no Boca de Cena. "O clima de teatro está no ar", dizia o guia. Claro que eu quis ir. E fomos.

A saída da estrada já era de terra. Seriam 8 km, coisa que eu só li depois que já estávamos no km 4 daquela estradinha, digamos, não muito fácil. Terra bem laranja, quase vermelha. E subida, subida, subida. Tanta subida que uma hora parecia que não tinha mais nada. Erramos, não é possível! Um penhasco gigantesco. À frente, nada se via, a não ser o céu. Dos lados, barrancos. Tipo desenho animado, sabe? Quando o carrinho vai subindo pela estradinha ao redor da montanha... Mas a gente já estava no topo! E nada!! A impressão que dava é que se continuássemos subindo íamos começar a despencar. MEDO, sério, muito! Ainda mais eu que não me dou bem com subidas íngrimes. Mas e como fazer o retorno pra descer de volta? Não tinha espaço. A gente ia cair no barranco, cer-te-za! Muito medo.

De repente, um milagre - porque, afinal, tínhamos rezado muito, em muitas igrejas, e merecíamos ajuda: lá vem um carro.
- Ooooi, por favor, a gente tá no caminho para Lavras Novas?
- Tá, é isso mesmo, é só seguir!
- Mas, meu Deus, parece que acabou a estrada, a montanha, o mundo!
- Ah, você precisa ver isso aqui à noite e na chuva! Mas vai, que é aí mesmo!

(Quem foi mesmo a pessoa que disse que eu quero ver aquela estrada à noite e na chuva????)

Ufa. Fomos. Mas ufa mais ou menos porque a gente começou a pensar que teria que voltar pela mesma estrada. Ah, mas sei lá... àquela altura - literalmente - nem sei mais o que eu tava pensando.

E eis que surge, do meio do nada, um vale colorido sob os nossos olhos (clique na foto para ver melhor). Que coisa bonita, meu Deus! Cenário de filme. Parecia uma maquete. A gente no topo da montanha e lá embaixo a pequena cidade de Lavras Novas. Que vista. Que alegria ver que não tínhamos chegado no fim do mundo, mas num mundinho novo e lindo.

Descida, descida, descida e entramos na cidade. Deserta. Cidade fantasma. Muito louco. Achamos o Boca de Cena. Fechado. E fechado que eu digo é fechado mesmo. Fechado pra sempre. Desativado. (Risos? Risos.). Pois é. Imagina a minha descepção. Depois de todo o medo, o lugar não existe mais. Mas, tá. Deus é grande. E me ama. "Estamos atendendo no Menestrel", lemos num papelzinho. Era um pouco antes, eu tinha reparado quando passamos. (Tem meia dúzia de casinhas, e ninguém na rua, não dá pra não reparar!) Fomos lá. Só nós na cidade fantasma, e as mocinhas que atendiam no Menestrel. Era do mesmo dono do Boca de Cena, o Jonas Block - hahaha. Não, eu também não sei como ele foi parar lá. Mas descubra no Menestrel Pousada e Café, que também tem cara de teatro. Então adorei. E comemos super bem. Uma delícia.

Lilian e Liliane, duas irmãs com aquele sorriso branco iluminado pela pele bem preta, nos atenderam, fizeram nosso crepe e nossa saladinha, e nos contaram tudo. O vilarejo já tinha sido descoberto por turistas havia algum tempo, e é reduto de gente de Belo Horizonte em feriados e finais de semana. Principalmente amantes de cachoeiras e esportes radicais. Estava vazio porque quem lotou o lugar no ano novo acabara de ir embora. Sorte nossa. E, além do mais, ali não era a cidade propriamente dita, ali era um "esticadinho" de pousadas e cafés. A cidade estava do outro lado do rio (ou de um vale, não lembro).

- Ah, ocês tem di i lá cunhicê. É bunitin dimaiss. i nossa mãe tem uma pôsadin lá, si ocês quisé passá a noiti.

Liliane e Lilian morreram de rir com a gente. Ainda mais quando perguntamos se elas eram de lá e se gostavam de morar em Lavras Novas. Elas AMAM! Não querem sair de lá por nada nesse mundo. Uma já foi pra Bahia. A outra conhece o Rio. Mas "é só pra passear". São Paulo? Nossa- Senhora-Mãe-de-Deus, nem pensar!!!! Elas é que estão certas.

E lá fomos nós, conhecer o vilarejo. A Cor Púrpura, lembra? É mais ou menos isso. Um achado de lugarzinho. Ainda bem que achamos antes que o mundo inteiro ache demais.

TODOS DA MESMA FAMÍLIA
A cidade tem uma igreja e duas ruas, que se encontram na curva de um U, atrás da tal igreja. Todos os moradores são negros. E simpáticos, e sorridentes, e gentis! E então nos contaram mais tarde uma das histórias da origem de Lavras Novas: um português foi para lá explorar ouro com quatro famílias de escravos. O ouro era muito pouco e ele resolveu ir embora. Levar os escravos era muito caro, então ele libertou o pessoal lá e deu aquelas terras pra eles. Pronto. Daí nasceu todo o vilarejo. É tudo uma família só. Deve ter uns mil e poucos habitantes. Mais um lugar mágico.

Depois de ver tanta coisa bonitinha e conhecer as irmãs queridas que trabalham no Menestrel, nem foi dolorido pegar a estrada de terra de volta. Eu queria ter ficado mais lá. Ou voltado. Mas preferi testar aquela idéia tida no Tragaluz e ficar com o encantamento da primeira vez.

(mentira! é que não deu tempo mesmo de voltar... mas fiquemos com a explicação poética, é muito mais legal.)

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