Lavras Novas.
A saída da estrada já era de terra. Seriam 8 km, coisa que eu só li depois que já estávamos no km 4 daquela estradinha, digamos, não muito fácil. Terra bem laranja, quase vermelha. E subida, subida, subida. Tanta subida que uma hora parecia que não tinha mais nada. Erramos, não é possível! Um penhasco gigantesco. À frente, nada se via, a não ser o céu. Dos lados, barrancos. Tipo desenho animado, sabe? Quando o carrinho vai subindo pela estradinha ao redor da montanha... Mas a gente já estava no topo! E nada!! A impressão que dava é que se continuássemos subindo íamos começar a despencar. MEDO, sério, muito! Ainda mais eu que não me dou bem com subidas íngrimes. Mas e como fazer o retorno pra descer de volta? Não tinha espaço. A gente ia cair no barranco, cer-te-za! Muito medo.
De repente, um milagre - porque, afinal, tínhamos rezado muito, em muitas igrejas, e merecíamos ajuda: lá vem um carro.
- Ooooi, por favor, a gente tá no caminho para Lavras Novas?
- Tá, é isso mesmo, é só seguir!
- Mas, meu Deus, parece que acabou a estrada, a montanha, o mundo!
- Ah, você precisa ver isso aqui à noite e na chuva! Mas vai, que é aí mesmo!
(Quem foi mesmo a pessoa que disse que eu quero ver aquela estrada à noite e na chuva????)
Ufa. Fomos. Mas ufa mais ou menos porque a gente começou a pensar que teria que voltar pela mesma estrada. Ah, mas sei lá... àquela altura - literalmente - nem sei mais o que eu tava pensando.

Descida, descida, descida e entramos na cidade. Deserta. Cidade fantasma. Muito louco. Achamos o Boca de Cena. Fechado. E fechado que eu digo é fechado mesmo. Fechado pra sempre. Desativado. (Risos? Risos.). Pois é. Imagina a minha descepção. Depois de todo o medo, o lugar não existe mais. Mas, tá. Deus é grande. E me ama. "Estamos atendendo no Menestrel", lemos num papelzinho. Era um pouco antes, eu tinha reparado quando passamos. (Tem meia dúzia de casinhas, e ninguém na rua, não dá pra não reparar!) Fomos lá. Só nós na cidade fantasma, e as mocinhas que atendiam no Menestrel. Era do mesmo dono do Boca de Cena, o Jonas Block - hahaha. Não, eu também não sei como ele foi parar lá. Mas descubra no Menestrel Pousada e Café, que também tem cara de teatro. Então adorei. E comemos super bem. Uma delícia.
Lilian e Liliane, duas irmãs com aquele sorriso branco iluminado pela pele bem preta, nos atenderam, fizeram nosso crepe e nossa saladinha, e nos contaram tudo. O vilarejo já tinha sido descoberto por turistas havia algum tempo, e é reduto de gente de Belo Horizonte em feriados e finais de semana. Principalmente amantes de cachoeiras e esportes radicais. Estava vazio porque quem lotou o lugar no ano novo acabara de ir embora. Sorte nossa. E, além do mais, ali não era a cidade propriamente dita, ali era um "esticadinho" de pousadas e cafés. A cidade estava do outro lado do rio (ou de um vale, não lembro).
- Ah, ocês tem di i lá cunhicê. É bunitin dimaiss. i nossa mãe tem uma pôsadin lá, si ocês quisé passá a noiti.
Liliane e Lilian morreram de rir com a gente. Ainda mais quando perguntamos se elas eram de lá e se gostavam de morar em Lavras Novas. Elas AMAM! Não querem sair de lá por nada nesse mundo. Uma já foi pra Bahia. A outra conhece o Rio. Mas "é só pra passear". São Paulo? Nossa- Senhora-Mãe-de-Deus, nem pensar!!!! Elas é que estão certas.
E lá fomos nós, conhecer o vilarejo. A Cor Púrpura, lembra? É mais ou menos isso. Um achado de lugarzinho. Ainda bem que achamos antes que o mundo inteiro ache demais.
TODOS DA MESMA FAMÍLIA
A cidade tem uma igreja e duas ruas, que se encontram na curva de um U, atrás da tal igreja. Todos os moradores são negros. E simpáticos, e sorridentes, e gentis! E então nos contaram mais tarde uma das histórias da origem de Lavras Novas: um português foi para lá explorar ouro com quatro famílias de escravos. O ouro era muito pouco e ele resolveu ir embora. Levar os escravos era muito caro, então ele libertou o pessoal lá e deu aquelas terras pra eles. Pronto. Daí nasceu todo o vilarejo. É tudo uma família só. Deve ter uns mil e poucos habitantes. Mais um lugar mágico.
Depois de ver tanta coisa bonitinha e conhecer as irmãs queridas que trabalham no Menestrel, nem foi dolorido pegar a estrada de terra de volta. Eu queria ter ficado mais lá. Ou voltado. Mas preferi testar aquela idéia tida no Tragaluz e ficar com o encantamento da primeira vez.
(mentira! é que não deu tempo mesmo de voltar... mas fiquemos com a explicação poética, é muito mais legal.)
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